O uso do fogo na prática pecuária é indiscutivelmente um risco, apesar de constituir uma atividade bastante difundida por muitos pecuaristas, antecedendo até mesmo o período de colonização.
Considerando a quantidade de incêndios de grandes proporções que resultam em impactos negativos, neste artigo, procuramos elencar os principais perigos envolvidos nessa atividade, bem como apresentar algumas alternativas para o manejo de áreas cultivadas. Confira!
Utilidade do uso de fogo na pecuária de corte
O emprego do fogo nas atividades agropecuárias é uma prática bastante antiga e difundida. Há relatos de que, na época da colonização, os indígenas já a utilizavam de maneira controlada. Com a chegada dos colonizadores, intensificou-se ainda mais o seu uso devido à implantação da monocultura de cana-de-açúcar.
Essa atividade se estende até os dias de hoje, sendo bastante comum no conceito de manejo de pastagens. Isso ocorre devido ao seu baixo investimento e fácil aplicação, possibilitando que haja o rebrote das forragens e a eliminação do acúmulo de matéria seca e pobre em valor nutricional.
Também é interessante destacar que existe uma questão cultural relacionada à essa prática na pecuária, visto que os manejos – especialmente aqueles relacionados ao trato com a terra e às criações extensivas – são passados de geração em geração.
Com esse cenário em mente e considerando a extensão territorial do nosso país, especialmente tratando-se de áreas dedicadas às pastagens, deve-se ressaltar os impactos e ameaças que esse manejo oferece, além de destacar que existem outras alternativas que proporcionam bons resultados, baseadas, inclusive, em estudos técnicos e acompanhados por órgãos conceituados, como a Embrapa.
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Quais os impactos causados pelo uso do fogo na pecuária e na agricultura?
A queimada, quando não bem planejada e executada, oferece inúmeros riscos ao solo, animais e população em geral. Listamos aqui algumas consequências importantes dessa prática:
- Alterações nas características biológicas, químicas e físicas do solo;
- Redução produtiva da terra;
- Relação direta com o aumento de prejuízos na produtividade de culturas, inclusive forrageiras;
- Piora na qualidade do ar;
- Aumento na incidência de doenças respiratórias, entre criadores e animais;
- Redução severa e não controlada da biodiversidade;
- Risco no trânsito aéreo por baixa visibilidade.
Vale ressaltar que o uso indiscriminado do fogo é capaz de eliminar nutrientes essenciais às plantas, como o nitrogênio, potássio e fósforo. A sua prática reduz, ainda, a umidade do solo, gerando a sua compactação e o consequente desencadeamento de processos erosivos que contribuem para a degradação da área.
Por outro lado, existem benefícios que podem ser conquistados com o uso controlado do fogo. Para atingi-los, é fundamental que se tenha conhecimento sobre a prática e como realizá-la.
Uso das queimadas como ferramenta
No Brasil, algumas áreas necessitavam de manejo de impacto para o seu desbravamento. A evolução de ecossistemas como os do Cerrado e do Pantanal tem relação direta com o uso do fogo como ferramenta de manejo apropriado, contribuindo com a estrutura e composição de vida nas pastagens dessas áreas. No entanto, deve-se destacar a necessidade de se ter um planejamento acertado para a realização dessa prática, objetivando gerar baixo impacto ambiental e econômico.
Algumas vantagens foram alcançadas a partir do uso consciente e controlado do fogo como ferramenta:
- Redução de matéria verde de baixo valor nutricional com incremento sucessivo de outras opções contendo boa margem nutritiva;
- Aumento da heterogeneidade ambiental para a biodiversidade;
- Ambientes de pastos mais homogêneos, favorecendo a melhor distribuição dos animais;
- Controle de pragas e otimização de processos ecológicos;
- Redução drástica no uso de ativos químicos para controle de pragas;
- Diversidade e fluxo de energia com maior ciclagem de nutrientes.
Com o fim de obter os melhores resultados que o uso das queimadas na pecuária pode oferecer, é necessário conhecer duas técnicas principais: queima controlada e queima prescrita. Em síntese, a principal diferença entre os dois manejos está no objetivo final.
Enquanto a queima controlada visa o uso do fogo em áreas determinadas para o andamento do agronegócio, a queima prescrita objetiva a conservação e pesquisa sob condições e objetivos específicos.
Queimada controlada e como executá-la
De acordo com a Embrapa, a queima controlada é a que melhor se aplica ao manejo de culturas e forragens, bem como ao cuidados com rebanhos.
Para o seu uso, é necessário definir bem os objetivos e a área a ser tratada, tendo em vista que o comportamento do fogo depende de fatores que fogem ao controle do ser humano, tais como:
- Topografia do terreno;
- Umidade;
- Ventos;
- Temperatura atmosférica.
Por isso, é fundamental respeitar as etapas envolvidas nesse processo, acompanhando a sequência de ações que vamos elencar a seguir.
Definição do objetivo
Conforme já mencionamos, o uso do fogo na pecuária de corte não pode ser indiscriminado. Portanto, é fundamental que, antes de mais nada, o agropecuarista defina os seus objetivos e tenha clareza de quais efeitos pretende alcançar.
De fato, o uso do fogo na agropecuária tem por fim promover a limpeza e rebrota de pastagens, além do combate à pragas e doenças.
Avaliação preliminar do terreno
O segundo passo envolve estratégias adaptadas para situações e propriedades específicas. Nesse momento, é essencial o cumprimento do artigo 4º do Decreto 2661/98, que estabelece obrigatoriedades para a obtenção de autorização para a queima controlada.
Uma sugestão de boa prática é a realização de um georreferenciamento com a definição das áreas de reserva legal, localização de cochos e aguadas, divisão das propriedades em unidades de manejo, áreas em que os trabalhadores atuam, sede e propriedades no entorno. Além disso, é importante também estabelecer as técnicas, a mão de obra e os equipamentos a serem utilizados.
Definição do plano de queima
De acordo com o artigo 5º do Decreto 2.661/98, se houver o cumprimento de todos os requisitos elencados no artigo 4º, o interessado no emprego do fogo deverá requerer perante o órgão competente, no Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, a emissão de autorização. Após o protocolo do pedido, a autoridade responsável terá o prazo de 15 dias para emitir a resposta.
No entanto, conforme o artigo 7º estabelece, se as terras estiverem localizadas em áreas com restos de exploração florestal ou limítrofes aos espaços de proteção especial, será necessária, ainda, a realização de uma vistoria prévia para que seja concedida a autorização da queima e o andamento do processo.
Preparação do terreno e definição do processo
Assim que as autorizações forem concedidas, chega o momento de preparar o terreno para a realização da queima controlada. É recomendável que ela aconteça em horário e condições adequadas, prezando pela segurança de todos. Dessa forma, o ideal é que a queima aconteça durante a noite ou ao amanhecer.
Para evitar contratempos ou ruídos de comunicação, é importante que cada pessoa envolvida nesse processo tenha uma atividade bem definida. A função do grupo é garantir que o fogo não saia de controle e ultrapasse os limites pré-definidos.
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Utilização de recursos adequados
Mesmo com o plano de ação, algumas questões podem sair de controle. Para que isso seja evitado, uma boa prática é avisar com antecedência ao menos uma unidade de combate a incêndios, podendo ser a brigada de incêndios florestais ou o corpo de bombeiros.
As pessoas que estiverem envolvidas na queimada também devem estar munidas com um equipamento de rádio ou mesmo um telefone para possibilitar a comunicação entre eles.
Por fim, levando em conta todas essas considerações, é fato que a ferramenta exige conhecimentos para que a execução do plano alcance os benefícios que a queimada pode proporcionar. Porém, o estudo de outras alternativas é fundamental para o sucesso da sua produtividade em regime extensivo.
Existem alternativas ao uso do fogo na pecuária de corte?
Com certeza. Dentre as principais opções, está o plantio direto em sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) que propõe o uso racional das áreas e sugere potencializar a capacidade produtiva tanto da terra, como dos rebanhos. Há também a pastagem ecológica, que nada mais é do que a associação do pastejo rotacionado com o cuidado das áreas de cultivo. O resultado é o aumento na produtividade, potencializando, inclusive, o uso de áreas menores.
O assunto tem sido levado tão a sério que, em outubro de 2021, foi aprovado o Projeto de Lei 11276/2018, intitulado como Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, dedicado à substituição gradativa das queimadas no campo por outras alternativas de manejo. Para tanto, os legisladores listaram algumas tecnologias alternativas, como a adubação verde, rotação de culturas, sistemas agroflorestais, extrativismo vegetal, agricultura orgânica, dentre outras.
Conforme foi abordado, o uso do fogo na pecuária de corte é uma prática bastante antiga e difundida que, apesar de contar com técnicas que auxiliem na contenção dos seus danos ao meio ambiente, ainda é um manejo que não se justifica. Atualmente, existem técnicas alternativas bastante assertivas que podem ser utilizadas tanto pelos pequenos produtores quanto pelos grandes.
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